Raul Seixas: Eu Sou – A série do Globoplay que mergulha na mente do Maluco Beleza

A minissérie biográfica Raul Seixas: Eu Sou surgiu como uma das produções mais aguardadas do cenário audiovisual brasileiro. Retratando um dos mais icônicos cantores e compositores nacionais, o Globoplay colocou a obra sobre Raul Seixas no ar em 26 de junho de 2025, em parceria com a O2 Filmes.

Falecido em agosto de 1989 e apontado por alguns como o pai do rock brasileiro, Raul é uma das maiores referências do rock para artistas até hoje. Sua atitude contestadora que mistura filosofia, crítica social e irreverência se tornaram um símbolo de liberdade e anticonformismo.

Muitos documentários e séries foram produzidos falando sobre a vida e a obra do Maluco Beleza. Contudo, Raul Seixas: Eu Sou, marca os 80 anos de nascimento de Raul e possui vários elementos que a tornam diferente de tudo o que já foi visto.

Do que se trata a série Raul Seixas: Eu Sou?

A proposta central de Raul Seixas: Eu Sou é narrar a trajetória de vida e obra do cantor, compositor, produtor e multi-instrumentista Raul Seixas. O ator Ravel Andrade, que também é músico, foi quem assumiu o papel principal. 

A narrativa se estende desde o nascimento de Raul, em Salvador (BA), passando por seus relacionamentos amorosos, sua “via crucis” pelas gravadoras da época, até sua ascensão como um dos grandes nomes da música nacional. O foco principal acontece nas décadas de 1970 e 1980, que foi o período mais intenso e definidor de sua carreira.  

Nesse contexto, vemos nascer a ideia da “Sociedade Alternativa” como uma filosofia libertária baseada nos ensinamentos do ocultista inglês Aleister Crowley, embora a ideia de uma comunidade física fizesse parte do sonho.

Também vemos na obra detalhes pessoais, como seus três casamentos (com Edith, Glória e Kika) e o profundo amor por suas filhas, bem como a tristeza que ele sentiu nas separações, motivadas pelo seu ritmo de vida e vícios.

Raul Seixas: o homem além do mito

Um dos objetivos mais ambiciosos da série é transcender a figura pública e o estereótipo do mito Raul Seixas. A produção se propõe a retratar o ser humano por trás da persona artística, explorando suas histórias pessoais, influências culturais, políticas e espirituais.

A obra detalha suas batalhas contra vícios, suas falhas como marido e pai, sempre acompanhada de sua incessante busca pelo que ele chama várias vezes de “verdade”.  

Direção e produção

A minissérie Raul Seixas: Eu Sou, foi dirigida por Paulo Morelli, figura central na idealização do projeto, ao lado de seu filho, Pedro Morelli. Paulo expressou que Raul Seixas tem sido parte de sua vida desde a juventude, o que influenciou também seu filho Pedro, 30 anos depois. Essa conexão pessoal e geracional demonstra a paixão pelo do universo do artista por parte dos diretores.

A produção executiva da série ficou a cargo de Gustavo Gontijo, e a equipe de produtores inclui Paulo Morelli, Bel Berlinck e Andrea Barata Ribeiro, com Cristina Abi como coprodutora. 

A construção narrativa de Raul Seixas: Eu Sou baseia-se em uma metodologia de pesquisa aprofundada, com o objetivo de apresentar a história mais fiel possível do artista. A série intercala acontecimentos reais com elementos criativos, buscando uma representação autêntica e interessante.

Esse compromisso com a pesquisa é um pilar fundamental para a credibilidade de qualquer produção biográfica. Os atores, incluindo Ravel Andrade e Tony Gambel, que interpretam Raul em diferentes fases de sua vida, realizaram um estudo minucioso do cantor, utilizando materiais íntimos aos quais poucas pessoas tiveram acesso. 

O Globoplay optou pela parceria com a O2 Filmes, uma das produtoras mais conceituadas do país, reconhecida por sua qualidade cinematográfica. A série é composta por oito episódios, com duração que varia entre 30 e 49 minutos, e foi filmada em 4K (Ultra HD).

O legado de Raul Seixas em foco

A minissérie Raul Seixas: Eu Sou procura apresentar um Raul Seixas multifacetado, descrito pelo próprio Ravel como “profundamente humano, contraditório, genial e provocador”. 

A figura do Maluco Beleza

É impossível assistir a série e deixar de notar a genialidade e o caráter revolucionário de Raul Seixas. Estes foram os principais componentes que fizeram de Raul um artista à frente de seu tempo:

  • Inovação e identidade nacional: Raul foi um dos primeiros a fundir o rock and roll com elementos genuinamente brasileiros, como o baião e o forró, o que resultou em uma sonoridade única. Sua música, com letras que exploravam filosofia, misticismo e críticas sociais de uma forma irreverente e poética, deu ao rock brasileiro uma identidade própria, distinta das imitações estrangeiras.
  • Influência duradoura: Raul Seixas ainda é uma das maiores referências para inúmeros artistas e bandas. Sua atitude contestadora e ousada se tornaram um símbolo de liberdade e questionamento.
  • Popularização do gênero: Sucessos como “Ouro de Tolo” e “Metamorfose Ambulante” o tornaram um fenômeno de massa, levando o rock a um público muito mais amplo. 

Raul foi um dos grandes responsáveis por consolidar o rock no cenário musical brasileiro. Bem diferente da mesmice da época, era impossível ficar indiferente a sua obra, irreverente e filosófica, misturando o subversivo com o lúdico.

A relação com a Ditadura e o ocultismo

A ditadura militar perseguiu a obra de Raul Seixas e de seu parceiro Paulo Coelho, principalmente por causa do caráter libertário e da crítica social nas criações. Sua abordagem irreverente, que misturava a crítica social com o misticismo e a busca pela liberdade individual, representava uma ameaça direta ao controle ideológico que o regime militar buscava impor.

As autoridades viam nas letras ambíguas e críticas uma forma de incitar a desordem. Estes foram os pontos de atrito:

  • A “Sociedade Alternativa“: A ideia, inspirada nos ensinamentos do ocultista Aleister Crowley, defendia que a única lei deveria ser “Faze o que tu queres, há de ser tudo da lei”. Para a ditadura, isso não era uma filosofia, mas sim um chamado à anarquia. Raul e Paulo Coelho foram presos em 1974 e torturados para revelar os nomes dos membros desse suposto movimento revolucionário, que na verdade não existia fisicamente. Essa perseguição culminou no autoexílio de Raul Seixas para os Estados Unidos.
  • “Ouro de Tolo” (1973): Uma das canções mais célebres de Raul, essa música é uma crítica ferrenha ao conformismo da classe média brasileira. Embora não tenha sido completamente censurada, a música incomodava as autoridades por satirizar a ilusão de prosperidade e o consumo, valores que o regime tentava propagar.
  • “Como Vovó Já Dizia” (1974): A letra original dessa música era “quem não tem colírio usa óculos escuros”. A censura, de forma inusitada, vetou a expressão, alegando que “colírio” era uma gíria para maconha. Para evitar o veto total, a letra foi alterada para “quem não tem colírio, o dia é claro e a noite é escura”, uma mudança que, na época, soou como uma piada para o público que entendia o contexto.
  • “Gita” (1974): O álbum homônimo de Raul, que tem “Gita” como faixa principal, foi lançado durante seu exílio. Ironicamente, apesar da perseguição inicial, o álbum se tornou um enorme sucesso, o que fez com que o governo o chamasse de volta, cinicamente alegando que ele era um “patrimônio nacional”.
  • “Rock das Aranha” (1980): Já no final da ditadura, a censura ainda agia. A música “Rock das Aranha”, do álbum Abre-te Sésamo, teve a sua liberação negada inicialmente. O censor, na justificativa, alegou que a letra “não apresentava nenhum valor artístico”, refletindo a arbitrariedade dos julgamentos da época.

A censura à obra de Raul Seixas não se limitou apenas a músicas específicas, mas foi uma tentativa de silenciar sua voz de protesto e sua capacidade de mobilizar o público. 

A minissérie Raul Seixas: Eu Sou apresenta a capacidade de Raul em reinventar letras para contornar a censura durante a Ditadura Militar , evidenciando sua inteligência e resiliência criativa em um período de repressão.

Depoimentos e material inédito

Raul Seixas, em vida, era conhecido por guardar tudo em seu “baú de memórias”, com a intenção de se perpetuar historicamente. Sua filha, Vivi Seixas, disponibilizou um vasto acervo que inclui demos, gravações, vídeos, filmes de Super 8, diários e figurinos de shows de seu pai. 

Essa riqueza de material íntimo permitiu uma imersão sem precedentes na vida de Raul. Assim, a série pode fundamentar a narrativa em detalhes autênticos e inéditos, proporcionando uma perspectiva única e íntima sobre ele. Além dos arquivos, a produção integrou depoimentos de colegas de banda e pessoas próximas a Raul para enriquecer a narrativa e oferecer múltiplas perspectivas sobre sua vida. 

O contato de Ravel Andrade com familiares, especialmente Vivi Seixas, foi crucial para que ele pudesse compreender Raul sob a ótica da filha. Paulo Morelli também realizou pesquisas com amigos e familiares próximos para obter acesso à intimidade de Raul , complementando os arquivos e depoimentos. 

Entrevistas com o elenco, diretores e membros da família (Vivi e Kika Seixas) foram conduzidas em eventos de lançamento , indicando a colaboração contínua da família com o projeto e sua disposição em compartilhar suas visões.  

Por que assistir Raul Seixas: Eu Sou?

A minissérie Raul Seixas: Eu Sou desempenha um papel crucial na revitalização do interesse pelo artista e na introdução de sua obra a novas gerações. A obra expõe as influências culturais, políticas e espirituais, bem como suas conquistas e lutas pessoais e profissionais, que foram fundamentais para a profundidade retratada por Raul. alcance tanto os fãs de longa data quanto novos públicos

A série explora a complexidade e a genialidade de sua arte, inserindo trechos das músicas em seus diálogos cotidianos, o que deixa claro que Raul não era um gênio intelectual, mas que criava espontaneamente. 

A série altera sequências reais e metafóricas, como a visão de um disco voador e “encontros” com figuras históricas e míticas (Dom Quixote, Lampião, Jesus Cristo, Elvis Presley) em um elevador. Esses recursos tentam traduzir o mundo interno singular de Raul, que era parte integrante de sua rica persona “Maluco Beleza”. 

A série apresenta aproximadamente 60 músicas de Raul. O conhecimento musical de Ravel Andrade, que toca violão e guitarra, junto com a escolha das músicas, dão uma ótima demonstração da obra de Raul Seixas para quem não o conhece. E quem já o conhece passa por uma experiência de reafirmação, nostalgia e introspecção.

E toca Raul!

As novas gerações podem até assistir a série concluir que Raul Seixas era um profeta bêbado e incompreendido que vivia à espera de um disco voador. Porém, os fãs originais, os mesmos que aprenderam a pousar a agulha sobre o vinil, hoje sangram seus olhos na luz fria de uma tela de celular, e a pergunta grita, inevitável: quando foi que tudo se perdeu? 

Existe uma geração que, ao ver Raul Seixas: Eu sou, sentirá o peso do tempo. São os mesmos que guardam fotos polaroides com roupas e cabelos vergonhosos, mas que carregam um vazio indefinível. Talvez seja, justamente, aquilo que a arte de Raul eternizou: a busca por aquilo que realmente somos.

Talvez a série nos lembre de que essa estranha nostalgia traz a resposta na própria obra do artista. Quem conhece Raul ouve suas músicas não para entendê-lo, mas para se entender. 

Palavras do Maluco Beleza: as estrelas nunca morrem.

Raul Seixas Eu Sou – A série do Globoplay que mergulha na mente do Maluco Beleza
Raul Seixas Eu Sou – A série do Globoplay que mergulha na mente do Maluco Beleza

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